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2 de fevereiro de 2004

Em que estação será que eu vou descer?

Abri os olhos. Acho que vi uma luz. Não... não era uma luz pois estou no metrô. Putz, será que eu cochilei e nem percebi? Estou lembrando que devo estar perto da minha estação, então é bom eu me levantar. O vagão está praticamente vazio. Isso é estranho, não lembro se estou atrasado ou não, mas no horário normal o metrô costuma estar lotado. Bom, é melhor assim!

Com o metrô vazio é mais fácil ouvir o som do atrito das rodas com os trilhos. Não é que quando ele está cheio não dê pra ouvir. É claro que dá. É um barulho ensurdecedor. Mas agora dá pra prestar mais atenção. Parece um coro de pessoas gritando. Lembra os gritos de fantasmas em filminhos de terror. Pelo menos essa é a impressão que fica pra mim. O som do atrito do metal... Mas tem alguma coisa diferente. Minha mente parece um pouco nebulosa. Não lembro do dia de ontem, estou apenas vivendo esse momento no metrô.

Viver o momento. Gosto dessa frase. Acho que a vida é bem mais fácil se você apenas relaxa e vive o momento. Sem se preocupar com detalhes ou pequenas coisas. Viver o momento sem criar muitas expectativas. Talvez seja utopia me sentir assim. Nunca havia me sentido, mas hoje eu acho que consegui. Porém um detalhe me chama a atenção: eu estou de pé no metrô e estou olhando para uma senhora. Tem alguma coisa no olhar dela. Serão os olhos verdes? Talvez sim. Verde pra mim sempre foi sinônimo de esperança. Mas o fato é: os belos olhos verdes dessa senhora estão olhando pra mim.

Como eu não havia percebido isso antes? E acho que ela me parece familiar. Os cabelos brancos, e as marcas do tempo escondem um rosto que já me foi conhecido, mas agora não sei dizer quem é ela. E ela me contempla com uma expressão triste. Parece alguém que perdeu algo muito importante. uma lágrima escorre de seu rosto.

No meu íntimo eu sinto que ela foi importante pra mim. Não quero que ela fique triste. Eu aceno pra ela e lhe mando o meu mais belo sorriso e espero que ela se anime. Mesmo com aquela expressão triste eu sinto que ela percebeu minha intenção. Quero dizer-lhe: "Estou bem, não se preocupe!" mas as palavras não saem da minha boca.

Olho ao redor e não vejo mais ninguém. O vagão está vazio e a estação demora a chegar. Faz tempo que passei pela estação brigadeiro e a paraíso é a próxima. Nunca demorou tanto. Agora estamos somente eu e a senhora no vagão. Mas o vagão não parece mais o mesmo. E a senhora parece se afastar de mim.

Aonde está ela agora? Parece que está tão longe. Não pode estar mais no vagão. Ou será que fui eu que sai? Não sei, mas sei que não queria partir sem me despedir dela. Então eu tento alcançá-la. Tento voar em sua direção! Me sinto leve e percebo que o chão no qual eu pisava não existe mais... O que aconteceu comigo? Onde estou?

Finalmente eu entendi. As vezes a falta de conhecimento é uma dádiva. Quando percebi o que estava acontecendo uma sombra triste passou por mim. Eu olhei lá pra baixo e vi aquela que já havia sido tudo para mim. E ao lado dela está um corpo inerte. Um homem, um senhor, com cabelos brancos, sombracelhas grossas, finalmente reconheci os traços apesar dos efeitos da idade naquele corpo. Aquele sou eu.

E ao meu lado, a senhora que me olhava enquanto eu abandonava a caracaça material que me prendia à terra, aquela era a minha alma gêmea. E depois de passar a metade da vida procurando por ela e a outra metade ao seu lado, mais uma vez nos víamos separados. Os momentos felizes passaram como um flash, como as pessoas paradas na plataforma de uma estação enquanto o trem passa veloz pelos trilhos. E apesar desta ser uma despedida, não pude deixar de sorrir depois de lembrar de tanta coisa boa que vivi enquanto tive o meu tempo. Tanta coisa boa ao seu lado. Sorrio e digo "adeus, estarei lhe esperando no lugar em que combinamos! É hora de partir para uma nova jornada."

Um comentário:

Anônimo disse...

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